quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Diferenças Acentuadas

Ora, havia um homem rico que se vestia de púrpura e de linho finíssimo, e todos os dias se regalava esplendidamente. Ao seu portão fora deitado um mendigo, chamado Lázaro, todo coberto de úlceras; o qual desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as úlceras. Veio a morrer o mendigo, e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; morreu também o rico, e foi sepultado. No hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe a Abraão, e a Lázaro no seu seio. E, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim, e envia-me Lázaro, para que molhe na água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que em tua vida recebeste os teus bens, e Lázaro de igual modo os males; agora, porém, ele aqui é consolado, e tu atormentado. E além disso, entre nós e vós está posto um grande abismo, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem os de lá passar para nós. Disse ele então: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai, porque tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham eles também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos. Respondeu ele: Não! Pai Abraão; mas, se alguém dentre os mortos for ter com eles, hão de se arrepender. Abraão, porém, lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tampouco acreditarão, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos.[1]

O texto é riquíssimo em informações e lições. Há paralelos interessantíssimos entre o rico e o pobre. Vejamos alguns:
O rico não é mencionado pelo nome, mas é apresentado pelos bens que possuía e seu estilo de vida pujante. Lázaro, a despeito de não possuir nada, a Bíblia faz menção do seu nome. Isso é extremamente significativo, pois para o judeu o nome ressalta aspectos relacionados ao caráter, traços personalísticos e aponta para relação com Deus. A mensagem de Lucas parece ser clara: somos conhecidos por Deus não pelo que possuímos, mas pelo que somos. No mundo, as pessoas são reconhecidas pelo que tem. É o que somos que nos faz conhecidos de Deus. No texto, o rico tem muitos bens, mas o maior bem que um homem pode ter é ocultado, seu nome. O outro homem citado no texto não tem bens, mas seu nome é eternizado na Bíblia. Os bens não eternizam ninguém, já o nome...
Lázaro é uma abreviação da expressão hebraica que significa “aquele que Deus ajuda”.[2] A partir dessa designação muitos podem objetar: como alguém cujo nome significa “ajudado por Deus” pode sofrer tanto nesta vida? Nisso parece que Lucas fornece outra lição preciosa. Lázaro foi ajudado por Deus não para ganhar fortuna neste mundo, mas para estar preparado para enfrentar a morte. A morte chega para ricos e pobres. O rico tinha tudo, mas não estava preparado para o dia da morte. Lázaro não tinha nada, mas estava preparado para enfrentar a morte. São oportunas as palavras de Martin Luther King: “Quem não está preparado para morrer, não está preparado para viver”.
 O rico alimentava-se de finas iguarias, contudo banquetes não saciam a alma. Lázaro enfrentava a falta de pão, mas tinha o “pão da vida”. Lázaro alimentava-se de esperança no porvir. No porvir, o rico soube o que significou viver uma vida sem esperança.
O texto chega a ser irônico quando aponta para a maneira como o rico e o pobre são carregados após a morte. O rico quando em vida era carregado pelos braços dos homens. Lázaro, quando em vida, a única vez em que foi carregado por alguém foi para ser jogado à porta do rico. Que lição! Muitos são bajulados e carregados pelos braços dos homens neste mundo, mas se esquecem que depois da morte os mesmos braços nada poderão fazer, senão carregar o defunto para o cemitério. Lázaro, depois da morte, é carregado não por braços de homens, mas por anjos.
O rico, quando em vida, não percebe Lázaro, mas depois da morte, o mesmo Lázaro é a única referência do rico no hades. Lucas nos brinda com outra lição de valor incomensurável. As pessoas estão digladiando entre si em busca de reconhecimento. Ser notado pelos homens neste mundo é objeto de desejo do ego humano. O problema é que os mesmos que são notados neste mundo, podem ser aqueles que farão parte de uma multidão que gritará para ser notada e visitada por aqueles que foram desprezados neste mundo, mas cujas vidas foram ajudas por Deus e chegaram ao lar celeste.
O rico, quando em vida, não pede nada a Deus, pois tem tudo às mãos. Lázaro pede aos homens, mas não recebe nada. O rico depois da morte pede muito, mas não recebe nada. Lázaro não precisa pedir nada, pois o céu desceu ao seu encontro. As orações daqueles que são “ajudados por Deus” não se perdem. A eternidade pode ser a resposta de Deus às orações não respondidas em tempos de sofrimento.
Há duas palavras no texto que se repetem: tormento e consolo. O rico consolado em vida entra em tormento após a morte. Lázaro atormentado em vida, desfruta de consolo após a morte. Esta é a lição: Não vale a pena trocar o transitório pelo eterno. Muitos estão desesperados em busca da felicidade neste mundo vendendo e penhorando valores morais e espirituais. O sofrimento em vida não fez com que Lázaro abrisse mão da esperança no eterno. Buscar consolo neste mundo comprometendo o eterno é loucura.


[1] Bíblia Sagrada. Lucas 16:19-31. 
[2] GARDNER, Paul. . São Paulo: 2000. p. 406.

Pr. Manoel Neto

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